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António Aleixo
António Fernandes Aleixo foi um poeta popular português.
Biografia
Considerado um dos poetas populares algarvios de maior relevo, famoso pela sua ironia e pela crítica social sempre presente nos seus versos, António Aleixo também é recordado por ter sido simples, humilde e semi-analfabeto, e ainda assim ter deixado como legado uma obra poética singular no panorama literário português da primeira metade do século XX.
No emaranhado de uma vida cheia de pobreza, mudanças de emprego, emigração, tragédias familiares e doenças na sua figura de homem humilde e simples, havia o perfil de uma personalidade rica, vincada e conhecedora das diversas realidades da cultura e sociedade do seu tempo. Do seu percurso de vida fazem parte profissões como tecelão, guarda de polícia e servente de pedreiro, trabalho este que, como emigrante foi exercido em França.
De regresso ao seu país natal, estabeleceu-se novamente em Loulé, onde passou a vender cautelas e a cantar as suas produções pelas feiras portuguesas, actividades que se juntaram às suas muitas profissões e que lhe renderia a alcunha de "poeta-cauteleiro".
Faleceu por conta de uma tuberculose, em 16 de Novembro de 1949, doença que tempos antes havia também vitimado uma de suas filhas.
Estilo literário
Poeta possuidor de uma rara espontaneidade, de um apurado sentido filosófico e notável pela «capacidade de expressão sintética de conceitos com conteúdo de pensamento moral», António Aleixo tinha por motivos de inspiração desde as brincadeiras dirigidas aos amigos até à crítica sofrida das injustiças da vida. É notável em sua poesia a expressão concisa e original de uma "amarga filosofia, aprendida na escola impiedosa da vida".
A sua conhecida obra poética é uma parte mínima de um vasto repertório literário. O poeta, que escrevia sempre usando a métrica mais comum na língua portuguesa heptassílabos, em pequenas composições de quatro versos, conhecidas como "quadras" ou "trovas", nunca teve a preocupação de registar suas composições. Foi o trabalho de Joaquim de Magalhães, que se dedicou a compilar os versos que eram ditados pelo poeta no intuito de compor o primeiro volume de suas poesias Quando Começo a Cantar, com o posterior registo do próprio poeta tendo o incentivo daquele mesmo professor, a obra de António Aleixo adquiriu algum trabalho documentado. Antes de Magalhães, contudo, alguns amigos do poeta lançaram folhetos avulsos com quadras por ele compostas, mais no intuito, à época, de angariar algum dinheiro que ajudasse o poeta na sua situação de miséria que com a intenção maior de permanência da obra na forma escrita.
Estudiosos de António Aleixo ainda conjugam esforços no sentido de reunir o seu espólio, que ainda se encontra fragmentado por vários pontos do Algarve, algum dele já localizado. Sabe-se também que vários cadernos seus de poesia, foram cremados como meio de defesa contra o vírus infeccioso da doença que o vitimou, sem dúvida, um «sacrifício» impensado, levado a cabo pelo desconhecimento de seus vizinhos. Foi esta uma perda irreparável de um património insubstituível no vasto mundo da literatura portuguesa.
A opinião pública e reconhecidos amigos
A partir da descoberta de Joaquim de Magalhães, o grande responsável por "passar a limpo" e registar a obra do poeta, António Aleixo passou a ser apreciado por inúmeras figuras da sociedade e do meio cultural algarvio. Também é digno de registo José Rosa Madeira, que o protegeu, divulgou e coleccionou os seus escritos, contribuindo no lançamento do primeiro livro, "Quando Começo a Cantar" 1943, editado pelo Círculo Cultural do Algarve.
A opinião pública aceitou a primeira obra de António Aleixo com bom agrado, sendo bem acolhida pela crítica. Com uma tiragem de cerca de 1.100 exemplares, o livro esgotou-se em poucos dias, o que proporcionou ao Poeta Aleixo uma pequena melhoria de vida, contudo ensombrada pela morte de uma filha sua, doente com tuberculose. Desta mesma doença viria o poeta a sofrer pelos tratamentos que vida lhe foi impondo, tendo que ser internado no Hospital – Sanatório dos Covões, em Coimbra, a 28 de Junho de 1943.
Em Coimbra começa uma nova era para o poeta que descobre novas amizades e deleita-se com novos admiradores, que reconhecem o seu talento, de destacar o Dr. Armando Gonçalves, o escritor Miguel Torga e António Santos Tóssan, o artista plástico e autor da mais conhecida imagem do poeta algarvio, amigo do poeta que nunca o desamparou nas horas difíceis. Os seus últimos anos de vida foram passados, ora no sanatório em Coimbra, ora no Algarve, em Loulé.
Homenagem e Consagração
Em homenagem ao poeta popular e à sua obra, muitos distritos portugueses atribuíram o seu nome a ruas e avenidas e até a diversas escolas, como:
O Liceu de Portimão passou a chamar-se Escola Secundária Poeta António Aleixo.
Em Paço de Arcos junto da Escola Náutica também existe uma rua com o nome de António Aleixo.
Em Setúbal, o nome do poeta foi também atribuído a uma rua de um bairro da cidade, situado na zona do Centro Hospitalar.
Em Camarate no Bairro São José
Em Albufeira, junto às praias no Algarve, e em muitas ruas espalhadas por esse Portugal fora e não só, pode-se ver e ouvir o nome do Poeta do Povo imortalizado em alguma placa.
Há alguns anos também passou a existir a «Fundação António Aleixo» com sede em Loulé e que já usufrui do Estatuto de Utilidade Pública, o que lhe permite atribuir bolsas de estudo aos mais carenciados, facto que deve ser encarado como bastante positivo.
O reconhecimento a este poeta tem-se repercutido noutros países de língua portuguesa, nos quais o nome de Aleixo foi imortalizado em instituições como, por exemplo, a Escola Poeta António Aleixo no Liceu Católico de São Paulo no Brasil.
Obra
António Fernandes Aleixo está hoje, bem enraizado e presente. As suas obras foram apresentadas na televisão, rádio e demais sistemas de informação, os seus versos incluídos em diversas antologias, o seu nome figura na história da literatura de língua portuguesa, é patrono de instituições e grupos político-culturais, existem medalhas cunhadas e monumentos erigidos em sua honra.
Fonte Wikipédia
ANTÓNIO ALEIXO
QUADRAS POPULARES
Eu não tenho vistas largas Nem grande sabedoria Mas dão-me as horas amargas Lições de filosofia
Vós que lá do vosso império Prometeis um mundo novo Calai-vos que pode o povo Querer um mundo novo a sério
Para a mentira ser segura E atingir profundidade Tem que trazer à mistura Qualquer coisa de verdade
Enquanto o homem pensar Que vale mais que outro homem São como os cães a ladrar Não deixam comer nem comem
Eu já não sei o que faça Para juntar algum dinheiro Se vendesse a desgraça Já hoje eu era banqueiro
Eu não sei porque razão Certos homens a meu ver Quanto mais pequenos são Uma mosca sem valor
Poisa com a mesma alegria Na careca de um doutor Como em qualquer porcaria Maiores querem parecer
|
À guerra não ligues meia Porque alguns grandes da terra Vendo a guerra em terra alheia Não querem que acabe a gerra
Que importa perder a vida Em luta contra a traição Se a Razão mesmo vencida Não deixa de ser razão?
Sei que pareço um ladrão Mas há muitos que eu conheço Que,não parecendo o que são São aquilo que eu pareço
A a grande terra Corrompe a humanidade Entre a cidade e a serra Prefiro a serra à cidade
O mundo só pode ser Melhor do que até aqui Quando consigas fazer Mais pelos outros que por ti
Bate a fome à porta deles E é lá mais mal recebida Do que na casa daqueles Que a sofreram toda a vida
E teres dias felizes Não digas tudo o que pensas mas pensa tudo o que dizes |
Vinho que vai para vinagre Não retrocede o caminho Só por obra de milagre Pode de novo ser vinho
Mentiu com habilidade Fez quantas mentiras quiz Agora fala verdade Ninguém crê no que ele diz
Quando os homens se convençam Que a força nada faz Serão felizes os que pensam Num mundo de amor e paz
Não sou esperto nem bruto Nem bem nem mal educado Sou simplesmente o produto Do meio em que fui criado
Porque será que nós temos Na frente aos montes aos molhos Tantas coisas que não vemos Nem mesmo perto dos olhos
Vemos gente bem vestida No aspecto desassombrada São tudo ilusões da vida Tudo é miséria dourada
Julgam-me muito sabedor E é tão grande o meu saber Que desconheço o valor Das quadras que sei fazer
Quantas sedas aí vão Quantos colarinhos São pedacinhos de pão Roubados aos pobrezinhos |
Num arranco de loucura Filha desta confusão Vai todo o mundo à procura Do que tem á mão
Entre leigos ou letrados Fala só de vez em quando Que nós às vezes calados Dizemos mais que falando
Quando te vez mal e dizes Que preferias a morte Pensa que outros menos felizes Invejam a tua sorte
Tem a música o poder De tornar o homem feliz Nem há quem saiba dizer Tanto quanto ela nos diz
Gosto do preto no branco Como costumam dizer Antes perder por ser franco Que ganhar por não ser
Queremos ver sempre à distancia O que não está descoberto Sem ligarmos importancia Ao que está à vista e perto
Sei que umas quadras são conselhos Que vosdou de boa fé Outras são finos espelhos Onde o leitor vê quem é
Quando não tenhas à mão Outro livro mais distinto Lê estes versos que são Filhos da mágoa que sinto |
Peço às altas competencias Perdão porque mal sei ler Para aquelas deficiencias Que os meus versos possam ter
Nos versos que improvisem Os poetas sabem ler Para além do que eles dizem Tudo o que querem dizer
Após um dia tristonho De mágoas e agonias Vem outro alegre e risonho São assim todos os dias
São parvos não ria deles Deixa-os ser que não são sós Às vezes rimo daqueles Que valem mais do que nós
Quem prende a água que corre É por si próprio enganado O ribeirinho não morre Vai correr por o outro lado
Embora os meus olhos sejam Os mais pequenos do mundo O que importam é que eles sejam O que os homens são no fundo
Julgando um dever cumprir Sem descer no meu critério Digo a verdade a rir Aos que me mentem a sério |
A quadra tem pouco espaço Mas eu fico satisfeito Quando numa quadra faço Alguma coisa com jeito
Quem nada tem nada come E ao pé de quem tem que comer Se alguém disser que tem fome Comete um crime sem querer
Nada direi mas enfim Vouter a grande alegria De a arte dizer por mim Tudo quanto vos diria
Falemos sinceramente Como pra nós mesmos a sós Lá longe de toda a gente Do mundo e até de nós
Há luta por mil doutrinas Se querem que o mundo ande Façam das mil pequeninas Uma só doutrina grande
A arte em nós se revela Sempre de forma diferente Cai no papel ou na tela Conforme o artista sente |
Forçam-me mesmo velhote
De vez em quando a beijar
A mão que brande o chicote
Que tanto me faz penar
Porque o mundo me empurrou
Caí na lama e então
Tomei-lhe a cor mas não sou
A lama que muitos são
Acho uma moral ruim
trazer o vulgo enganado:
mandarem fazer assim
e eles fazerem assado.
Sou um dos membros malditos
dessa falsa sociedade
que, baseada nos mitos,
pode roubar à vontade.
Esses por quem não te interessas
produzem quanto consomes:
vivem das tuas promessas
ganhando o pão que tu comes.
Não me dêem mais desgostos
porque sei raciocinar...
Só os burros estão dispostos
a sofrer sem protestar!
Esta mascarada enorme
com que o mundo nos aldraba,
dura enquanto o povo dorme,
quando ele acordar, acaba.
António Aleixo
Quadras recebidas por emeil desconhecendo a sua origem